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Salto na corrente de comércio do Brasil pode explicar surpresas do PIB, diz Padovani

Roberto Padovani, economista chefe do banco BV, diz que, além desse impulso externo, economia foi favorecida pelos estímulos fiscais por conta da pandemia e por impactos ainda não mensurados das reformas

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Edição invistaja.info e MarketMsg

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TLCP4 | EV/EBITDA: -36.16 | Liq.Corr.: 0.61 | PSR: 0.586 | Div.Brut/Pat.: 1.21 | P/VP: 1.25 | P/Cap.Giro: -1.96

A soma das exportações e importações brasileiras, a chamada corrente de comércio, como proporção do PIB, deu um salto nos últimos anos e isso pode ser um fatores que explicam os constantes erros de projeções do economistas sobre o crescimento do produto interno bruto nacional. A avaliação é de Roberto Padovani, economista chefe do Banco BV, em entrevista ao (MarketMsg), que apontou ainda entre os “candidatos” a atrapalhar os modelos usados para os cálculos a intensidade e simultaneidade dos estímulos fiscais na pandemia e os possíveis impactos de reformas estruturais no país.

Ele destaca que a corrente de comércio nos aos 1990 rodava a uns 15% do PIB e  depois, com boom de commodities e estabilidade econômica no país, saltou para 20% do PIB. “Aí ficamos ali parados uns 20 anos. Depois da pandemia, a gente saltou para 30% e isso nunca tinha acontecido. Por que fomos tão surpreendidos pela balança comercial? A quantidade exportada voou, disparou”, compara.

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Para Padovani, há explicações tanto conjunturais como estruturais para esse movimento, incluindo quebras de safras em países concorrentes em commodities agrícolas e sinais de esgotamento do modelo da China, que faz o gigante asiático perder mercados globais. “A gente está vendo claramente o caso do México, da Índia, e até do Brasil absorvendo uma parte da produção”.

O economista do BV também falou de temores com o setor fiscal nos Estados Unidos e sobre a dificuldade de percorrer a “última milha” do combate à inflação. Veja a seguir os principais trechos da entrevista:

A cada ano, os economistas têm errado em suas projeções para o PIB brasileiro, que vivem “surpreendendo” a cada divulgação do IBGE. Qual a explicação para isso?

A gente costumava errar câmbio, juros, inflação, mas errar PIB é uma novidade. O que a gente aprende na faculdade é que, quando erra um ano, pode ter sido um choque não esperado. Mas quando é todo ano, tem um erro consistente, significa que o seu modelo não está capturando alguma coisa nova, o modelo é que está errado. E aí tem três candidatos para falar por que os nossos modelos estão errados. O primeiro é que os estímulos fiscais e monetários a partir de 2020 foram inéditos na história, nunca tínhamos visto todas as economias do mundo, ao mesmo tempo, dando muito estímulo. Você pode pensar em 2020 e 2021, erramos no PIB porque teve um fator de curto prazo que foi o ineditismo dos estímulos econômicos. Outro fator que atrapalhou nossa vida é que a corrente de comércio saiu de 20% para 30%. O ano passado é típico: o PIB cresceu 2,9%, só que 46% desse crescimento, ou seja, quase metade, foi de commodities. Uma pancada, que ninguém sabia que estava acontecendo. Um impulso externo, vamos dizer assim. E tem um terceiro fato, que não dá para mensurar, que foram as reformas feitas entre 2016 e 2021. A reforma trabalhista foi importante, mas quanto de PIB ela implica? Marco regulatório do saneamento foi importante, mas quanto essa injeção de dinheiro privado vai implicar em PIB? E a autonomia do BC, reforma da Previdência, marco regulatório do gás? A gente não sabe fazer essa conta.

Então, vamos ter surpresa de novo este ano?

Esses três fatores, conjunturais e estruturais, a gente não sabe os efeitos. Então, não tem mais nada a dizer do PIB? Mais ou menos. A gente está perdido, mas o que nos salva é que, nos modelos que todos os economistas fazem, vão aprendendo com os dados, vão estabelecendo novas correlações. Você não precisa saber o que está acontecendo, mas está  vendo que tem outro padrão de crescimento. Está lá e acaba sendo incorporado nos modelos porque tem inércia. O fato de o crescimento depender um pouco do crescimento passado está incorporando estatisticamente essa informação de uma mudança estrutural. No final, uma dia a gente vai voltar a acertar no PIB. Mas não porque soube o que aconteceu. Basicamente porque a economia se movimentou sozinha.

Esse salto comercial veio para ficar ou pode sofrer impactos de uma China crescendo menos?

O Brasil, depois da pandemia, deu um salto na corrente de comércio como proporção do PIB. Nos aos 1990, rodava a uns 15% do PIB e, depois, com boom de commodities, estabilidade econômica no país, a gente saltou para 20% do PIB. Aí ficamos ali parados 20 anos. Depois da pandemia, saltou para 30% e isso nunca tinha acontecido. Por que fomos tão surpreendidos pela balança comercial? A quantidade exportada voou, disparou. Uma coisa conjuntural é que teve quebra de safra na Argentina, na Ucrânia e nos Estados Unidos, mas a gente nota que o Brasil começou a ganhar mercado globais. A gente abraça uma tese, que é do José Roberto Mendonça de Barros, de que o único setor no Brasil que há muito tempo investe muito e tem a produtividade elevada é o agronegócio. E a impressão que a gente está tendo hoje é que o agro brasileiro está imbatível no mundo. Mas não é só o agro, teve coisas adicionais: o Brasil aumentou sua produção e exportação de petróleo e de minério. Vale, Petrobras e o agronegócio mudaram a cara do Brasil no comércio exterior.

Mas pode ter um contágio da China?

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Esse canal de contágio de China acontece menos sobre o PIB. Continua acontecendo no lado da inflação, porque o custo das empresas cai. A gente viveu num mundo de China crescendo 10% ao ano, em média, com produtos industriais baratos pelo mundo, uma exportação da desinflação global. Minha geração ficou o tempo todo dos anos 1990 e 2000 tentando entender por que a inflação do EUA só caía. Tinha vários fatores, como envelhecimento da população, pouco investimentos e o efeito China, um país exportando inflação baixa, através dos preços industriais. Agora, tem três coisas acontecendo na China que já vem desde 2011, mas ficou claro depois da pandemia em 2021 e 2022, que foi o fato de a China não contar mais com uma oferta abundante de mão de obra. O processo de urbanização está se esgotando e a gente vê isso pelo custo unitário do trabalho, que está em alta. Isso tem feito com que a China perca mercados globais. Tem menos competitividade. Chega um momento em que a oferta de mão de obra se esgota e o crescimento passa por uma fase dura porque passa a depender mais de produtividade, de ambiente de negócios, qualificação de mão de obra, infraestrutura. Enquanto a China teve esse boom de crescimento, de quase 40 anos, isso gerou bolhas, principalmente no mercado imobiliário, e as bolhas estouraram. Com essa abundância do ciclo depois de 2011, o governo adotou uma política de deixar a coisa se ajustar. A cereja no bolo são as tensões geopolíticas, as tensões pós-pandemia com relação à questão sanitária, de logística. Tem uma série de incertezas que passaram a envolver a economia chinesa, que não estavam presentes antes e isso aumenta muito os riscos de se fazer negócios na China.

O impacto global tende a ser menor?

Pode-se dizer que a China cresça 4% ou 5%, mas ainda é uma economia gigante, uma base enorme, tem a história de olhar o PIB nominal. Mas o que a gente nota é que, quanto menos impulso a China dá ao crescimento global, menor é a chance de ter um aumento de preços de matérias-primas. Então o que a se nota são ciclos coincidentes: enquanto a China cresceu alucinadamente, a cesta de commodities deflacionada, em termos reais, cresceu junto. Depois que a China mudou esse ritmo de crescimento, o preço de commodities entrou num canal de baixa. Esse mundo de China acabava afetando países como o Brasil, países exportadores, porque tem um canal de baixa nas matérias-primas no mundo todo. Acho que está todo mundo comprado com essa teses de que temos uma desaceleração estrutural à frente.

Sobre a economia americana, os problemas fiscais estão sendo menosprezados?

Parece que não tem problema fiscal lá. Até entendo isso, porque teve esse nível de dívida lá no pós-Guerra: entre 1940 e 1945 tinha entre 100% e 110% de dívida/PIB norte-americana. Passada a Guerra, teve um longo período de queda, oscilou na casa de 20% a 30% do PIB, então nunca foi um tema a dívida pública americana. Veio a crise financeira de 2008 e deu uma puxada, mas estava tudo bem porque o juro real era negativo. Mas chegou na pandemia, deu mais um salto. Antes, a dívida era baixa e ninguém falava, depois a dívida explodiu, mas o juro real era negativo.  Só que essa é primeira vez desde o pós-Guerra que vai ter uma dívida na casa dos 110% do PIB com o juro real positivo. Acho que não está no radar dos investidores esse problema. A eleição norte-americana para mim é importante por esse aspecto. Qualquer um que ganhar a eleição, seja Biden ou Trump, vai ter que lidar com esse tema e isso vai ser ruidoso.

Isso pode virar um tema nas eleições?

Vai ter esse debate de republicanos e democratas, mas a gente já viu que com Trump e Biden a história foi meio parecida. Pode ter um estilo diferente de um e de outro, mas o grande debate vai ser como fazer: vai aumentar impostos ou vai cortar despesas? Se falar para os democratas que vai cortar despesas, os caras vão ter um troço, eles vão querer aumentar impostos. Se falar para os republicanos, vai ser o contrário, vão tentar cortar despesas ferozmente. O mercado talvez não ligue muito porque a economia norte-americana tem uma reputação incrível, nunca deu calote, tem credibilidade. Agora, essa credibilidade muda: já teve um downgrade na nota de classificação de risco, essas cosias mudam rapidamente. Não sei exatamente como vai acontecer, mas esse é um debate que vai entrar no radar e é o grande desafio de eleição norte-americana.

E qual sua leitura sobre inflação e juros nos EUA?

O mercado estava muito otimista no final do ano passado [com a proximidade dos cortes de juros pelo Fed] e agora está menos. A razão é que todo mundo vê a inflação caindo nos EUA, com o emprego preservado e com espaço para cortar juros. Nesse quadro, a economia mundial vai bem e os fluxos de capitais se mantêm para os mercado emergentes. Então, o dólar cai no Brasil e isso contribui para a inflação recuar aqui dentro e abre espaço para o BC ser mais agressivo nos juros. Portanto, todo mundo prevê uma surpresa no crescimento econômico, essa é a lógica que todo mundo está vendo e o raciocínio está correto, não discordo dele. O problema é que inflação caiu de fato nos EUA, de 9% para 3%, mas se pegar o CPI, ele não está mais em queda, está parado desde junho do ano passado. E a inflação de serviços voltou a acelerar. Parece que essa última milha é mais complicada do que o mercado está imaginando.

Quem vai cortar os juros primeiro, o Fed ou o BCE?

A economia norte-americana se mostra muito mais forte do que a europeia. A gente vê isso também nos níveis de taxa de inflação: na Europa, a inflação está rodando mais baixa, o headline, pelo menos. Portanto, tem mais espaço para cortar juros na Europa do que nos EUA. Faz todo sentido esse cenário de BCE começar a cortar juros ante do Fed. Parece que uma história na Europa de que “estamos mais seguros” de que a inflação vai continuar convergindo para a meta. Lá tem mais segurança porque, basicamente, a atividade econômica está mais fraca. Nos EUA, a economia é mais flexível, mas está reacelerando e essa convergência parece que é menos clara.

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REFLEXÃO: Harold Pollack, da Universidade de Chicago: Guarde entre 15 e 20% e invista em fundos de índices com taxa baixa.

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